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19 jun 2019

Notas sobre a Greve Geral do dia 14 de junho

O dia 14 de junho de 2019, uma sexta feira, foi escolhido pelas centrais sindicais para a construção da greve geral contra a reforma da previdência do governo Bolsonaro. Quem se lembra do dia 28 de abril de 2017 (dia da greve geral contra a reforma trabalhista e da previdência do ex-presidente Temer) se recorda de como estava a cidade pela manhã, totalmente vazia, os ônibus, metrôs e trens não saíram das garagens, as cooperativas menores de transporte rodaram, mas o povo não conseguiu sair dos terminais. Aquelas categorias que não tinham força e nem organização para conseguirem parar, contaram com os travamentos feitos pelos movimentos sociais, e com a greve no transporte para conseguir ficar em casa ou se integrar ao dia de luta.

A greve do dia 28 escapou do controle das centrais e por isso atingiu tão forte o capital com um rombo estimado de 5 bilhões no comércio. Mais de 150 cidades registraram paralisações com uma adesão de cerca de 40 milhões de pessoas. O movimento das centrais depois da greve foi negociar com o governo a situação das centrais, buscando caminhos alternativos para manter a estrutura sindical com o fim do imposto, e no próximo dia de greve marcado para o dia 30 de junho houve uma desmobilização total por parte da burocracia sindical, que chamou o dia da greve como dia “nacional de mobilização”.

Ato no dia 14 de junho na João Dias

Mais uma vez neste 14 de junho vimos as centrais sindicais venderem os direitos do nosso povo, desmobilizando totalmente a greve, pedindo para que aqueles que pararam ficassem em casa. Os sindicatos de rodoviários e ferroviários em São Paulo anunciaram no último momento que não iriam mais aderir a greve, o que teve um forte impacto na desmobilização.  Depois de anunciada a saída dos pontos mais polêmicos da previdência, como capitalização, BPC (Benefício de Prestação Continuada), e o endurecimento da regra para aposentadoria rural, o relator do parecer da reforma também deu autonomia para os Estados e municípios se integrarem ou não na reforma. Os governadores da oposição como PT e PCdoB sentaram na mesa de negociação da reforma mais um vez, o que influenciou as centrais a boicotarem a greve em silêncio, se pintando de luta em frente a FIESP. Essa foi uma outra cena do alinhamento das burocracias com o boicote a greve, a CET solicitou as centrais que marcassem a concentração em outro lugar porque o MASP estava em reforma, e assim fizeram.

Antes mesmo de retirar a capitalização da reforma da previdência, centrais como UGT e Força Sindical, já estavam negociando com o governo Bolsonaro gerir os fundos de pensão privados de previdência em parceria com os bancos. Essa desarticulação também abriu portas para a repressão em todos os Estados, com mais de 100 pessoas presas em diversas ações durante o dia, 3 pessoas em São Paulo permanecem detidas em um CDP em Pinheiros.  Não é uma surpresa que a burocracia sindical tenha tentado desarticular a greve, para manter os privilégios da estrutura sindical e fazer acordos com as cúpulas do governo.

Mesmo com o boicote da burocracia milhares de pessoas foram às ruas construir travamentos e manifestações, em algumas cidades como Salvador as paralisações no transporte chegaram a 70% dos ônibus. Em São Paulo foram articulados diversos travamentos na zona sul, organizados principalmente pelo povo das ocupações de moradia, porque enquanto as direções sindicais abandonaram as ações de rua, as mulheres, negros e negras das ocupações, que ocupam as piores condições de trabalho, quando não desempregados foram os mais expressivos nos travamentos. Os estudantes também tiveram um papel importante na construção da luta contra a reforma, pautando-a desde o primeiro ato nacional no dia 15 de março contra os cortes da educação (dia que foi inicialmente marcado como dia de luta contra a reforma), e foram o alvo da repressão no travamento na zona oeste e nas detenções na Consolação.

De acordo com a CUT foram cerca de 45 milhões de pessoas atingidas e envolvidas, e cerca de 380 cidades tiveram alguma ação contra a reforma, no jornal Valor Econômico a estimativa foi de 123 cidades. A ausência de estimativas mais aproximadas e de cobertura da grande mídia é parte do boicote a greve, mas também mostra que o impacto econômico e social da greve foi muito inferior ao dia 28, no dia 14 às ruas estavam movimentadas e os comércios funcionando. Algumas cidades do interior e na região metropolitana de São Paulo tiveram uma adesão muito mais forte.

As burocracias sindicais e estudantis têm mostrado seu papel retrógrado nas lutas, negociando com os patrões e desmobilizando nosso poder de combate, e condenando as ações que escapam ao seu controle como em junho de 2013, nas ocupações de escola¹, no ato dos secundaristas autônomos no dia 23 de maio, e no boicote às greves gerais. Cada vez se torna mais claro para nós a necessidade de impulsionar a luta para além do controle das burocracias, pois somente a partir de descontrole é que pode nascer a autonomia e independência do nosso povo.

Notas:

[1] Em 2015 no momento em que havia mais de 70 escolas ocupadas em São Paulo as entidades estudantis, UNE, UBES, UMES, UPES e UEE, tentam negociar com o governo Alckmin a desocupação das escolas em troca de uma prorrogação de 15 dias no prazo da reorganização escolar. Tentaram atropelar a direção autônoma do movimento sem ter o mínimo apoio das escolas ocupadas.

Anexos:

https://epocanegocios.globo.com/Economia/noticia/2017/04/epoca-negocios-comercio-podeperder-algo-proximo-de-r-5-bilhoes-com-greve-geral.html

https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2017/04/28/para-comerciantes-de-sao-paulo-greve-geral-foi-pior-do-que-feriado.htm

https://economia.uol.com.br/noticias/efe/2017/04/28/greve-geral-reune-40-milhoes-de-trabalhadores-dizem-sindicatos.htm

https://www.valor.com.br/politica/6306865/analise-apoio-inedito-reforma-e-ingrediente-queafeta-greve-geral

https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/06/1895694-centrais-sindicais-divergem-e-desistem-de-greve-geral-no-dia-30.shtml

https://www.brasildefato.com.br/2019/06/14/greve-geral-termina-com-mobilizacoes-em-360-cidades-contra-a-reforma-da-previdencia/

https://www.guarulhoshoje.com.br/2019/06/14/greve-geral-deixa-guarulhos-sem-transporte-e-em-clima-de-feriado/

https://www.metrojornal.com.br/foco/2019/06/13/greve-geral-sindicato-dos-metalurgicos-abc.html

https://www.redebrasilatual.com.br/trabalho/2019/06/metroviarios-de-sao-paulo-param-ferroviarios-desistem-e-motoristas-de-onibus-surpreendem

https://www.valor.com.br/brasil/6201429/terceirizados-fazem-7-de-cada-10-greves-do-setorprivado

https://www.valor.com.br/brasil/6201441/greves-de-terceirizados-foram-70-do-total

https://www.valor.com.br/politica/6307259/greve-geral-tem-atos-em-pelo-menos-123-cidades-do-pais

https://www.facebook.com/ferroviariosdesp/photos/a.309320415773917/2392976867408251/?type=3&theater

Por Seixas – Nascido no Grajaú em São Paulo, atualmente morador da Zona Norte. Atua na luta nos territórios da periferia e nas escolas, sempre junto no combate ao racismo.

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