Composição da categoria bancária e dos trabalhadores dos bancos.
O sistema financeiro possui hoje algo próximo a 486 mil funcionários [1] contratados como bancários. Eles estão concentrados nos cinco grandes bancos de atuação nacional que dominam mais de 80% do sistema financeiro nacional, o Banco do Brasil, Bradesco, Itaú, Caixa Econômica Federal e Santander [2]. Existe também algo em torno de 150 bancos menores, a maioria deles privados, e alguns poucos, mas importantes, bancos públicos regionais que sobreviveram à onda de privatizações da década de 90, como o Basa (Banco da Amazônia, com 3.081 funcionários), o Banco do Nordeste (7.214 funcionários), o BanriSul (Banco do Estado do Rio Grande do Sul, com 10.725 funcionários), etc.
As 5 maiores instituições bancárias do Brasil em número de funcionários:
Instituição | Número de funcionários |
Banco do Brasil | 99.121 |
Bradesco | 98.808 |
Itaú | 96.435 |
Caixa Econômica Federal | 87.654 |
Santander | 47.404 |
As profundas desigualdades regionais no Brasil fazem com que o controle do movimento sindical bancário no nível nacional seja concentrado no Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e região que concentra uma base de 142 mil bancários. A metrópole paulistana abriga o maior centro financeiro da América Latina e a sede dos principais bancos privados, concentrando, portanto, a maioria dos bancários, fazendo com que a região Sudeste concentre 60% dos bancários do país [3].
A categoria bancária apresenta uma tendência constante de redução da década de 80, quando chegou a agregar 900 mil trabalhadores, aos dias atuais com 486 mil. Esse fenômeno é normalmente atribuído à digitalização, mas a imensa expansão do sistema financeiro nacional nas últimas décadas se deu de forma a subordinar trabalhadores de diversas outras categorias a ser explorado pelos bancos, assim como transferir o próprio trabalho bancário ao cliente pelos canais digitais [4].
Houve, portanto, uma profunda reorganização, fragmentação e terceirização dos trabalhadores dos bancos. De forma que hoje há diversos trabalhadores não bancários que trabalham para os bancos, como os correspondentes bancários, que são funcionários de outras empresas que realizam serviços bancários (pagamento de boletos, empréstimos, abertura de contas, etc) em comércios, agências dos correios, casas lotéricas, etc. [5] Entre as categorias de trabalhadores que são hoje contratados em grandes proporções pelos bancos estão: Os trabalhadores de empresas conglomeradas aos bancos (seguradoras, cartões de crédito, previdência privada, maquininhas de vendas, etc) correspondentes bancários, vigilantes, transportes de valores, suporte técnico e manutenções diversas, terceirizados de limpeza, financeiras, tecnologia da informação, operadores de telemarketing para atendimentos diversos, jovens aprendizes, construção civil, etc. Existe uma estimativa do Sindicato de que o número de trabalhadores dos Bancos que não são contratados como bancários esteja na casa de 1 milhão de trabalhadores [6]. Em comum, essas diversas categorias tem o fato de receberem uma remuneração média e terem condições de trabalho e de organização políticas muito inferiores aos dos bancários.
A militância bancária hoje: Direção do sindicato e oposição sindical.
A militância de bancários é fortemente concentrada nos bancos públicos, onde ocorre a maior parte da atuação, nacionalmente, das diversas correntes políticas e sindicais. Essas são dirigidas, em última instância, pelo Partido dos Trabalhadores (PT) que controla o sindicato dos bancários de São Paulo. O movimento dos trabalhadores bancários possui uma forte e robusta organização nacional que é o seu principal trunfo político.
O gigantismo do aparato do sindicato dos bancários de São Paulo reverbera em poder nas centrais sindicais, partidos políticos, governos e empresas privadas. O sindicato dos bancários de São Paulo possui sete sedes regionais bem localizadas (Osasco, Centro, Paulista, Leste, Oeste, Sul e Norte), é um dos controladores (junto ao sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo) da revista do Brasil, do canal de televisão TVT, da rádio e do portal de jornalismo online rede Brasil Atual. Possui empresas como a Bangraf (um moderno parque gráfico) a Bancred (uma cooperativo de crédito) e a faculdade privada 28 de Agosto. Além disso, mantém assentos na direção da FUNCEF, o fundo de pensão dos trabalhadores da Caixa, e da PREVI, o fundo de pensão dos trabalhadores do Banco do Brasil (o maior fundo do tipo da América Latina e que controla empresas como Vale S.A. e a Oi Telemar). O atual presidente da CUT é ex-diretor do sindicato de bancários de São Paulo e o atual presidente da CTB é ex-diretor do sindicato dos bancários da Bahia. Ex-dirigentes do sindicato de bancários de São Paulo se tornaram ministros, deputados, vereadores e empresários.
O aparato sindical bancário tem nacionalmente suas principais diretorias controladas desde o fim da ditadura pela CUT (PT), apesar de fazer composição com outras forças em suas chapas diretoras e existir uma grande variedade de organizações (sobretudo ligadas a partidos como PCdoB, PSol, PSTU, PPL, etc) que controlam alguns sindicatos de bancários no interior e com bases menores. Abaixo, faço uma lista dos grupos políticos que dirigem os dez maiores sindicatos de bancários com a relação da quantidade de bancários filiados.
Dez maiores sindicatos da categoria bancária (dados de 2017):
Sindicato | Filiados | Organização Política dirigente |
Sindicato dos Bancários de São Paulo | 47.407 | PT (Articulação) |
Sindicato dos Bancários de Brasília | 18.800 | PT (Racha da Articulação) |
Sindicato dos Bancários de Porto Alegre | 14.686 | PT (DS) |
Sindicato dos Bancários de Belo Horizonte | 13.161 | PT (Articulação) |
Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro | 12.351 | PT (Articulação) |
Sindicato dos Bancários da Bahia | 8.546 | PCdoB (CTB) |
Sindicato dos Bancários de Curitiba | 8.079 | PT (Articulação) |
Sindicato dos Bancários do Ceará | 6.003 | PT (Articulação) |
Sindicato dos Bancários de Campinas | 5.135 | PPS |
Sindicato dos Bancários do Espírito Santo | 4.661 | PSOL (Intersindical) |
A militância bancária dentro e fora das diretorias dos sindicatos é hegemonizada pelas grandes organizações sindicais, o que significa que ela é enquadrada nas suas rígidas hierarquias, que hoje tem, em imensa maioria, uma política voltada prioritariamente à disputa e manutenção do aparato sindical atrelado ao Estado, desenvolvendo uma prática política e uma forma de mobilização estritamente corporativa que é a forma que o nosso sindicalismo de Estado impõe juridicamente. Essa rígida hierarquia cria uma forma de ação política burocratizada, ambiente hostil ao trabalhador comum, onde as decisões e ações são muito distanciadas das bases, que só são acionados para referendar decisões já tomadas pelas cúpulas sindicais e partidárias.
O resultado tem sido uma militância cada vez mais voltada para carreiras políticas individuais e para a reprodução da ordem vigente, reproduzido um sindicalismo submisso às classes dominantes e, estruturalmente, inimigo do real avanço da luta dos trabalhadores [7], acumulando um histórico cada vez mais longo de enfraquecimento da luta dos trabalhadores e perdas de direitos para a categoria bancária.
Os grupos que não estão na diretoria dos aparatos sindicais se organizam hoje nas chamadas “oposições sindicais”. Seu modo de atuação espelha o das direções sindicais, só que com menor porte e estrutura, reproduzindo as mesmas práticas. Normalmente as oposições são subordinadas a organizações hierarquizadas em que a direção é composta majoritariamente por membros da diretoria de outros sindicatos que não são de bancários. Esse modelo de atuação de oposição sindical despende seus esforços em pautar a ação da estrutura sindical e tem como horizonte último disputar e ganhar as suas eleições. A oposição também acaba sendo um reforço da própria diretoria do sindicato, por fortalecer e legitimar as ações do sindicato. Ao disputar ações, apontar os erros e pontos fracos da direção, ela ajuda a diretoria a melhorar sua própria ação. A estrutura do sindicalismo atrelado ao Estado e de atuação estritamente corporativa da direção sindical limitam os horizontes de atuação das oposições a reproduzir a esses mesmos limites. Por isso, um dos nossos grandes desafios também é o de superar o modelo de oposição sindical para atuar com os trabalhadores bancários para além das organizações burocráticas.

A superação do modelo burocrático sindical: é preciso priorizar a luta independente dirigida pelos próprios trabalhadores!
Uma primeira tarefa, se quisermos superar o modelo do sindicalismo burocrático, é o de conseguir criar espaços de trabalhadores, onde seja possível forjar pensamento, formulação organizativa, tática e estratégica, que consiga ousar pensar e agir para além das grandes organizações sindicais excessivamente submetidas a hierarquia carreirista do aparato sindical de Estado, com tudo que isso significa em termos de subordinação de classe, corporativismo, e submissão às lógicas hegemônicas de representação.
Ousando forjar novos arranjos organizativos, que consigam permitir espaço real para divergências de pensamento e elaboração. Capaz de unir as lutas, na prática organizativa e na ação direta, dos trabalhadores de diferentes categorias sem passar pelo crivo burocrático das cúpulas sindicais, unindo lutas de bancários, terceirizados, e outras em que a união se mostrar possível. Conseguir ser capaz de estabelecer aliança real entre lutas territoriais e nos locais de trabalho, gerando estruturas mais descentralizadas e menos vulneráveis a cooptação, com força para não temer dirigir suas próprias lutas sem respaldo das estruturas do Estado. Que consiga envolver os trabalhadores dentro de uma perspectiva de participação ativa e não apenas como base passiva, adestrada e manipulada livremente.
Avançar na capacidade de criação e imaginação política e organizativa é o nosso grande desafio, como trabalhadores, para consegui resistir aos crescentes ataques do capital que nos submete de frente na exploração do trabalho, e pelas costas, utilizando contra nós as organizações políticas e sindicais que criamos no passado.
Por Gabriel Silva – Bancário e militante do Quilombo Invisível.
Notas
[1] Consultado no Caderno de Subsídios da 20ª Conferência Nacional dos Bancários (CONTRAF/CUT). Junho de 2018. Fonte CAGED – Ministério do Trabalho. Elaboração: DIEESE.
[2] Números de funcionários do grandes bancos extraídos da revista anual: Valor Grandes Grupos, Dezembro de 2018, editora Globo.
[3] Dados extraídos da Pesquisa de Emprego bancários de 2011 do DIEESE: https://www.dieese.org.br/pesquisaempregobancario/2011/empregoBancario10.pdf
[4] Sobre a transferência de trabalho bancário para os clientes ver o excelente artigo de Heloisa Yoshioka, “As formas de exploração da indústria digital: o novo protagonismo da exploração do usuário. https://quilomboinvisivel.com/2019/05/07/as-formas-de-exporacao-na-industria-digital-o-novo-protagonismo-da-exploracao-dos-usuarios/
“A “revolução” trazida pela mentalidade das startups consiste no questionamento de como é possível transferir o trabalho para fora da empresa utilizando as tecnologias digitais, assim, garantindo um corpo de funcionários mais enxuto para as empresas e uma produtividade jamais vista anteriormente.”
[5] Levantamento afirma que havia 293,8 mil correspondentes bancários em todo o Brasil em 2015, é imaginável que esse número seja bem maior hoje. https://ecommercenews.com.br/artigos/tendencias-artigos/o-que-vem-depois-das-agencias-e-dos-correspondentes-bancarios/
Hoje o número de postos de atendimento de correspondentes bancários também já é muito superior que o de agências bancárias:
https://sindicario.com.br/noticia/numero-de-correspondentes-bancarios-supera-o-de-agencias/
[6] Esse número, de 1 milhão de trabalhadores dos bancos que não são bancários, aparece no livro “90 anos fortalecendo a democracia. Bancários de São Paulo (1923 – 2013)”, publicação do próprio Sindicato dos Bancários de São Paulo. Porém, a base do cálculo não é esmiuçada no livro. Uma tarefa importante também é a de aprofundar nosso conhecimento sobre a composição dessas outras categorias cujo trabalho é subordinado aos bancos.
[7] Essa linha de raciocínio, sobre a falta de independência de classe na direção das principais organizações sindicais bancárias hoje, também é desenvolvido aqui: Adoecimento no trabalho – Um debate da militância bancária: http://passapalavra.info/2018/11/123510/
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