Só quem se movimenta sente as amarras que lhes prendem
Quando pensamos em violência contra mulher nos vem o seguinte questionamento: o que se passa na cabeça desses homens que enxergam a mulher como sua propriedade? São inúmeros os abusos ocasionados por eles nessa sociedade machista e doente. O que mais me entristece são mulheres que ainda não enxergam a opressão que sofremos e acabam culpando as próprias mulheres, reforçando essas amarras de tanto tempo. Pois bem, viemos de um contexto histórico no qual os coronéis tinham as mulheres como sua propriedade. Alguns termos abusivos vieram com isso, como “quero lhe usar”, “venha me servir”, “hoje vou lhe procurar,’’ etc. Acontecia nas melhores famílias.
Por sua vez, existe aquele que tem uma proteção excessiva para criar uma dependência emocional. Como se a mulher não fosse capaz de tomar nenhuma decisão sozinha, precisando do aval dele, do “homem”. Acredito que esse seja o pior de todos, aquele que manipula seus amigos, seus familiares, seus chefes. Ou usa uma religião como forma também de contenção e manipulação!

Sabe aquele ditado? Filho de peixe, peixinho é. Poderia ser apenas um estereótipo, mas não é. Aquele filho que viu sua mãe ser constantemente agredida pelo seu pai, cresce com essa violência no seu subconsciente e, quando ele se vê contrariado, recorre ao único método de lidar que ele conhece. Mesmo não concordando muitas das vezes com tal ato, é uma cultura machista na qual o homem só é “cabra macho” se colocar a mulher “no seu devido lugar”, segundo eles. Pessoas que só sabem o que é falta de amor e respeito.
O que fazer se é tão difícil perceber esse tipo de homem? Pois eles estão travestidos de bondade, querendo impressionar, com proteção excessiva, cuidados demasiados, autoritarismo, ciúmes exacerbados. Primeira coisa: o homem que te ama não vai querer mudar nada em você, ele te ama e te respeita pelo que você é, uma mulher, cheia de vontades e desejos!
A tortura psicológica começa quando você percebe que pode viver sem aquela pessoa que te deixava dependente emocionalmente, então vem as palavras depreciativas, do tipo: “Você não é nada nem ninguém”, “ninguém vai te querer”, ”você é burra”, “eu te tirei da lama”, “eu te dei valor”, “você vai ver o que eu vou fazer com você!” Mas calma, primeiro, quando ele perceber que você está saindo do controle dele, ele tentará culpar alguém: uma amiga que está tentando abrir seus olhos. Vai te afastar de sua família, “todos tem inveja da nossa felicidade”, até a máscara dele cair… Quando você deixar bem claro que sabe quem ele é, ele vai apelar para seu emocional, usando toda sua insegurança, aquilo que te desmonta. Se mesmo assim ele não conseguir, então aquele macho tão compreensivo vai partir para a agressão física, seu último recurso! E ainda vai querer te culpar, te fazer culpada por todas atitudes erradas dele. Você que ocasionou isso tudo, você é quem faz ele tomar esse tipo de atitude. Vem a difamação: “Você é louca descontrolada”, “você é promíscua”, “vagabunda”, “irresponsável”.
Os homens usam a dependência financeira para acusar as mulheres de serem um peso morto na vida deles, de nunca fazerem nada, sendo que eles nunca deixaram elas trabalharem por serem os provedores. Essas mulheres passaram anos da sua vidas dedicadas a um relacionamento falido. Lavando, passando, e cozinhando sem reconhecimento, como se não fizessem mais do que sua obrigação, pelo bem da família e de seus filhos. Fazendo e vivendo a vontade exclusiva de seus maridos.
Esse é o “peso morto” que eles carregaram: mulheres excluídas do mercado de trabalho porque dedicaram sua vida à família, à criação e educação de seus filhos e aos cuidados da casa e do marido. Se a mulher trabalha em casa, ela só trabalha por causa dele, “porque ele deixa”. Até quando vamos reproduzir tamanho absurdo? Quando vamos começar a exigir respeito?
Esses homens deixaram nossas mulheres sem autoestima, sem acreditar no próprio potencial, achando que nós não somos capazes de se restabelecer, de amar novamente, ou melhor dizendo, de SE AMAR!
Precisamos entender esse contexto dos coronéis, e deixar bem claro que o tempo da opressão e da senzala acabou! Se eles se sentem ameaçados por mulheres empoderadas, é porque dentro deles existe um homem inseguro, machista e doente!
“Os homens que não amavam as suas mulheres” – Eu não diria os homens que não amavam as suas mulheres, porque a mulher é um ser único, singular, e pertence a ela mesma. Ela não tem dono, e sim um companheiro, alguém para somar e não dividir!
Os homens tem que admitir que precisam acompanhar a evolução desses seres tão especiais em construção, que buscam por respeito, reconhecimento e valor em uma sociedade machista e doente. Quem vai olhar para essas mulheres? As mulheres precisam se ajudar, e não se verem dentro de uma lógica de competição de mercado, não se colocarem como objetos disponíveis para o “homem”.
Uma forma de contenção dessa violência é a exposição, eles devem sim ser denunciados. Expostos para que todos saibam que ali jaz um homem problemático, nada confiável, pois quem bate ou tortura psicologicamente uma mulher não merece a menor confiança.
Agora eu me pergunto, quem vai nos ajudar? Quem? O governo? A sociedade dividida por uma massa de hipócritas e machistas? As mulheres suportam uma vida em suas costas e depois não se reconhecem.
Mas somos nós mulheres, que vamos mudar esse contexto. Somos nós mulheres unidas, tendo sororidade umas com as outras. Hoje foi a tua vizinha, amanhã pode ser tua filha! Então, acorda! Tenho certeza que esses homens quando eram crianças não gostavam de ver suas mães apanhando de seus pais. Então por que eles repetem os mesmos erros de seus pais?
É uma questão cultural? Sim, também. Quando somos criados com determinados costumes, isso se torna algo tão natural e ao mesmo tempo enraizado dentro de nós, que parece tão corriqueiro… E ainda dizem que a mulher nordestina é valente! Valente para trabalhar, valente para criar e educar seus filhos. Ninguém nunca olhou no fundo dos olhos dessas mulheres nordestinas, com o seu rosto marcado pelo sol, suas mãos calejadas pelo trabalho e viu, por trás de um sorriso, o grito de socorro de sua alma! É um prisão sem muros. Elas foram chantageadas, amordaçadas, ameaçadas, oprimidas, e desvalorizadas. “Prendam suas cabritas, porque meu bode está solto!” – Uma frase popular do Nordeste totalmente machista que o homem diz para seus vizinhos, seus amigos, para dizer para os homens “pegar geral”, como se as mulheres tivessem que estar sempre ali disponíveis para eles. As amarras da opressão precisam ser quebradas! Movimente-se!
Lucineide Oliveira e Silva – Mulher nordestina, mãe de três filhos e um neto dos quais me orgulho, Renandelon, Luísa Dálete, Victor Luiz e Lorenzo neto. Graduante no curso de Direto e faço parte das PLP ( promotora Legais Populares) na luta pelo direito a vida, igualdade, respeito e dignidade da mulher! As mulheres da minha geração foi criada em um sistema partriarcal o qual a mulher vem um pensamento “machista” onde todo o poder estar relacionado ao homem, para mim que fui criada dentro dentro deste sistema, tive que lutar contra essas amarras quando me vi dentro de um relacionamento abusivo onde me deparei com a seguinte pergunta. O que eu fiz com a minha vida? O que eu posso fazer para desconstruir tudo isso, pelo qual fui subjulgada! Somos mulheres , somos um ser em construção!
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