
Quando fui convidado para fazer parte do Quilombo Invisível no ano de 2019, um dos pontos que mais me interessou e chamou atenção foi o fato de que o coletivo se posicionava sempre com uma postura anticapitalista, alinhada a classe trabalhadora.
Diante disso, ao escrever, debater e trabalhar qualquer questão social a gente precisa ter o cuidado de lembrar de que lado nós estamos. A qual classe social nos integramos, que é obviamente o conjunto da classe trabalhadora.
O ano de 2020 tem sido um ano muito complexo e conturbado apesar de termos apenas três meses toda sorte de problemas surgiram e todos eles afetando diretamente os mais pobres. Agora, o que assola o mundo todo e particularmente aqueles que não são alcançados pelas políticas públicas é a pandemia causada pelo COVID-19, uma mutação do Coronavírus, assim, se faz extremamente necessário discutir como esse vírus influencia a dinâmica de funcionamento da nossa sociedade.
Para isso, alguns pontos precisam ser definidos. O vírus vai se espalhar rapidamente, chegando a regiões mais afastadas, com menos recurso e estrutura para lidar com os casos mais graves. Entretanto, a gente precisa ter um cuidado de pensar que apesar de ser muito importante defender o SUS, principalmente em tempos de neoliberalismo e privatização de todos os serviços essenciais para a classe trabalhadora. É extremamente necessário compreender que quando falamos de “estrutura para lidar” nós não estamos falando apenas do SUS, mas também de acesso a saneamento básico. Uma das recomendações mais básicas das Organizações de Saúde é para lavar as mãos com muita frequência. Entretanto, a falta de acesso a direitos é tão grande para a camada mais pobre da população que uma parcela considerável das pessoas não tem acesso a água ou água limpa para lavar as mãos, sofrendo com racionamento ou estando em situação de rua.
Como essas pessoas conseguem se prevenir se não tem acesso a direitos básicos?
E quanto aqueles que prestam serviços considerados “essenciais” para garantir o conforto e o luxo da burguesia durante a quarentena? E quando aos trabalhadores e trabalhadoras que simplesmente não podem parar? Que tem que se deslocar por horas num transporte lotado, precarizado, pagando uma alta tarifa. Como essa pessoa evita aglomerações? Como essa pessoa pode se permitir parar se a ela esse direito é negado?
Nesses momentos, o capitalismo mostra suas facetas mais perversas. O capitalismo joga e brinca com a vida, controla e define por meio da sua biopolítica quem vive e quem morre e conhecendo bem as nossas sociedades e o que as estruturam é fácil saber também quem são aqueles que mais morre, a qual classe, gênero, raça e etnia que pertencem. A violência do capitalismo se dá em diversas esferas.
No entanto, essas mortes que estão aumentando a todo o momento não podem ser atribuídas somente ao vírus em si, o capitalismo e a ideologia neoliberal tem ligação direta com isso e contribuem para a elevação do risco de morte para a classe trabalhadora.
Para isso, é preciso lembrar da Reforma Trabalhista, aprovada em 2017 por Michel Temer (PMDB),e o aprofundamento do desmonte dos direitos trabalhistas decretado com a chamada “carteira verde e amarela”, a MP905 de Eduardo Bolsonaro (aprovada na surdina durante plena pandemia pelo senado). Tornando generalizado relações de trabalho sem direitos, como os cada vez mais numerosos trabalhadores que trabalham por aplicativos (Uber, Rappi, Ifood, etc) sem contrato via CLT.
Os empresários e gestores que se beneficiam de relações de trabalho super precarizadas também tem sangue em suas mãos uma vez que esse trabalho é adoecedor, impossibilitando com frequência que os trabalhadores consigam ter para si e sua família condições de moradia digna e alimentação adequada, tornando-os alvo mais vulneráveis nessa nova pandemia.
Essas pessoas trabalham, sem garantias, em contato direto com outras pessoas. Como elas vão ficar sem trabalhar ficando sem dinheiro para comer e pagar o aluguel? Como vão evitar contato com outras pessoas no trabalho? E ao se contaminarem, para quem vão recorrer para o tratamento? Vão para o SUS, pois muito provavelmente um hospital particular será caro demais para essa pessoa, esse mesmo SUS que é alvo de constante ataque dos liberais e conservadores.
O vírus, vai afetar e ser potencialmente mais letal nos países mais pobres, localizados na periferia do capitalismo, aqui o vírus é potencialmente mais perigoso não pela sua gravidade em si, mas pela miséria em que vive grande parte da população e também pela dificuldade de acesso ao tratamento.
Neste momento, vejo uma discussão muito forte sobre o funcionamento do SUS, várias pessoas mal informadas ou mal intencionadas criticando dizendo que não funciona. Se “esquecendo” ou deixando de mencionar que o Sistema Único de Saúde é responsável pela vigilância sanitária, uma vez que a Anvisa também faz parte do SUS, pela elaboração de vacinas e patentes uma vez que a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) é um centro de pesquisas que trabalha diretamente em parceria com o SUS. Deixando de mencionar que ele também é responsável pelo maior sistema de transplantes do mundo e também planejamento de ações de saneamento básico. E o mais importante de tudo isso, o SUS é a única alternativa para grande parte da classe trabalhadora.
Entender que esse sistemas tem falhas é muito importante, mas ter a noção de que em um governo que adote a ideologia neoliberal de Estado Mínimo, o SUS é alvo de ataque e desmonte. A ineficiência, demora, filas e falta de leitos está atrelada as diversas sabotagens que o sistema sofre por parte daqueles que hoje são responsáveis por administrá-los, pessoas eleitas que representam os interesses da burguesia, dos grandes conglomerados médicos e hospitais privados que rivalizam com o SUS. Para eles, desmontar o sistema é prioridade, por isso, ao invés de apenas reclamar da saúde pública, devemos defende-la, entender que há um plano de desmonte do que é público em curso e que a saúde pública para muitos é a única opção. Devemos pressionar o poder público para a melhoria do SUS, não nos deixar cair nas mentiras que os burgueses nos contam de que seria melhor privatizar.
Outro ponto para considerarmos nessa análise é que devemos ter um olhar especial para a classe trabalhadora que foi expulsa dos centros da cidade e jogada nas periferias em casas sem estrutura, lotadas e sem ventilação, esgoto à céu aberto, recebendo intervenção policial que destrói suas casas, famílias e vidas. Como nós, da periferia vamos resistir a qualquer que seja a epidemia, crise ou surto nestas condições tão precárias?
É também preciso pensar na população em situação de rua que é diariamente exposta a fome, má nutrição, baixa imunidade, falta de acesso a informação e que muitas vezes são totalmente desamparadas pelas políticas públicas.

O ponto é que a epidemia demonstra muito bem a violência estrutural a qual estamos sujeitos. Mas a violência não é indiferente, ela adota critérios bem específicos para definir quem morre e quem vive com ou sem epidemia. A violência estrutural do capitalismo define bem quem tem direitos e quem sofrerá com a falta de acesso às políticas públicas. Qual será o efeito desse momento nas consciências?
A burguesia e a classe trabalhadora estão em constante embate, afinal, a luta de classes é real e constante. Os burgueses nos oprimem e matam. A base do capitalismo é a exploração e desigualdade, a burguesia sabe que para se manter no “topo” precisa oprimir a classe trabalhadora e quando vamos olhar os eixos fundamentais dessa classe trabalhadora podemos rapidamente perceber que raça e etnia são fatores fundamentais para considerarmos. É fundamental que a comunidade preta tome consciência de que estamos sujeitos a mais uma forma de violência, dessa vez mascarada de epidemia, mas que escancara a desigualdade a qual o nosso povo está sujeito.
Mas então, diante dessa situação tão grave o que fazer? Apenas constatar o problema e as violências as quais estamos submetidos parece não ser o suficiente. É preciso pensar coletivamente em estratégias para garantir a nossa própria sobrevivência e resistência, nós que não podemos nos isolar em ilhas paradisíacas, nós que vivemos as vezes numa casa com um ou dois cômodos para 5 ou 6 pessoas, nós que sofremos com o racionamento de água que é usada em abundância pelo agronegócio. O que nós, a classe trabalhadora podemos fazer ou exigir? Quais seriam a saídas para garantir a sobrevivência?
É difícil pensar em respostas prontas para isso, afinal, elas não existem. Porém, existem medidas que podemos tomar como indicativos de qual caminho devemos seguir. Por isso, é importante considerarmos e refletirmos sobre a importância, frente a essa crise, de:
Revogar o Teto de Gastos e ampliar o investimento em políticas públicas, suspender as cobranças de água, luz, gás e aluguel, garantir assistência e renda aos trabalhadores informais, acolher a população em situação de rua e garantir tratamento adequado a eles e indultar os presos, tendo em vista que a chance de proliferação do vírus nas condições precárias da vida do cárcere é absurda. É urgente criar e fortalecer redes de solidariedades entre os de baixos nos bairros, para podermos ajudar uns aos outros e pressionar por mudanças.
Mas, acima de tudo, frente as crises cíclicas do capitalismo se faz extremamente necessário reafirmar o compromisso anticapitalista, em defesa da vida, contra esse sistema assassino. A vida, dentro do capitalismo é cada vez mais insustentável.
É preciso também tomar cuidado com a abertura para a repressão, muito se tem dito para utilizar a polícia e exército para manter as pessoas forçosamente em casa (como se tem feito em alguns países da europa). No entanto, devemos sempre lembrar que a “crise” é sempre uma justificativa para a expansão da repressão que é sempre contra os pretos e pobres, fica a questão, como a polícia vai querer garantir a quarentena na periferia? Será com os métodos genocidas que ela usa habitualmente?
É fundamental nos posicionarmos em defesa e pela ampliação do SUS pois acesso a saúde é um direito básico. E a vida nesse sistema nunca vai ser garantida, por isso se movimentar em prol do fim do capitalismo é ação necessária da classe trabalhadora.
É extremamente importante pensar em organizações de trabalhadores, organizar greves e pressionar os patrões para garantir seu direito a quarentena é uma alternativa que deve ser cada vez mais frequente.
De qualquer maneira, considero a situação atual caótica e preocupante. Temos adoecido mentalmente pensando nisso, pensando em como mais uma vez são os meus que morrem. Pensando em como esse sistema é injusto, destrutivo e assassino. Desejo a todos nós muita coragem e força para lutar, nesse período difícil o auto-cuidado e o cuidado com os nossos toma a forma necessária de uma luta de classes pela vida.
Por Marcus Nascimento, militante preto, anticapitalista e estudante de serviço social na Unesp.
2 Comentários
Para que esse plano sinistro de pessoas insanas e desequilibradas, egóicas, não dê certo é só o povo se atentar para as questões de que uma gripe simples mata mais do que qualquer vírus (pessoas com baixa imunidade), a fome e o descaso matam mais do que qualquer outro vírus que se criou em um País que só preza o capital, e agora vem comprar muitas empresas no Brasil, não queremos uma China no Brasil, queremos um Brasil dos Brasileiros, esse vírus criado e aceito por muitos talvez com interesses econômicos em causar a miséria de uns e riqueza de outros é uma Vergonha Nacional, é como se não tivéssemos governantes, pois que ajudam a paralisar alguns e outros não, quem pensou que seria diferente, pois é, onde está a diferença… Até “pandemia” já estamos tendo. Povo para de ter medo e de achar que vai ganhar sem trabalhar ou sem pagar caro por essa ideia sórdida e por que não dizer burra, pois que vai contra a lei natural da vida. Chega de criarem entre si EUA China e Brasil contratos de economia e comecem a criar Qualidade de Vida para todos esse sim tenho certeza que é o Pano Divino. Vergonha Nacional é gerar medo, atestar estado de calamidade, quando milhares de pessoas sempre morreram de fome, doenças por falta de medicações e atendimentos adequados, por ignorância devido a má qualidade de educação nesse e em outros Países, enquanto Países que só visam lucro e capital atiram M no ventilador e depois saem na boa. Acorda Povo, retoma a luta, o trabalho, não cai na onda de ideias de muitas religiões, eles não vão pagar as tuas contas, vamos cobrar dos políticos, do Presidente que não deve ser conivente com essa situação de pandemia. gripes sempre existirão… O que não pode mais existir é atrasar e deixar de cumprir as Leis , a Aposentadoria por exemplo é um direito do aposentado deve ser automática, o Código Penal deve ser revisto e penalidades para crimes de morte e estupros revistos (Prisões colônias) sem custo para população, todos sabem, mas então o que falta para colocar em prática, ou a elite precisa ainda ser servida? Logo também vão deixar de ser elite… Vamos trabalhar e parar com esse MIMIMI de urgência, pois a conta quem paga é quem criou ou seja a China e não o povo que está sendo obrigado a pedir o que é de seu direito, uma vez que o IRF foi cobrado, deve voltar para o povo Brasileiro e não para buscar pessoas que decidiram viver ou viajar para outros Países, devem ficar lá, uma vez que gastavam lá e não em seu País… Sr. Presidente resolve logo essa bagunça, pois isso representa uma vergonha Nacional e atestado de má administração. Por favor pega outra estrada que não a dá catástrofe, se não os eleitores vão acabar achando que esse governo é de mau agouro, Primeiro a tal da facada, depois Brumadinho, o atraso aos aposentados, a criminalidade a esmo e agora a tal de pandemia, assim tu vai ficar mesmo desacreditado…