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22 mar 2020

Notas de rodapé sobre motins policiais, greves, emancipação, fascismo e a formação social brasileira – parte 2

[ Esse artigo será publico em 3 partes, clique para ler a parte 1 ]

Afinal, a que classe social pertence a polícia?

    Há ainda algumas considerações a se fazer a respeito da composição social desse objeto que até agora chamamos genericamente de “aparato repressivo”, o instrumento armado que constitui a coluna vertebral do Estado e o garantidor de sua função primordial, que é sempre a defesa da propriedade da classe dominante. Existe uma diferença significativa entre forças policiais e Forças Armadas propriamente ditas, que no Brasil são Exército, Marinha e Aeronáutica, embora ambos sejam parte do aparato (assim como as prisões e em certo sentido o judiciário, ministério público, etc.). As Forças Armadas são destinadas a um hipotético confronto com outros países, são formadas por uma massa de soldados recrutados por meio do serviço militar obrigatório, originados na sua maioria da classe trabalhadora, que passam por esse período de serviço apenas por um curto momento (um ano, no caso do Brasil), antes de voltar para a vida civil, comandados temporariamente por uma minoria de oficiais profissionais permanentes.

    Num confronto aberto contra o Estado, é muito mais viável convencer soldados das Forças Armadas a se voltar contra seus oficiais comandantes, do que fazer isso com policiais. Soldados não têm vínculos permanentes com os oficiais, que pertencem a outra classe social, e por isso estão mais propensos, em determinadas condições extremas, a apoiar a classe da qual saíram. Os integrantes da polícia, ao contrário, são recrutados por concurso para uma uma carreira que deve durar a vida inteira, até a aposentadoria, com vínculos permanentes, formação, treinamento e especialização nas suas funções.

    No caso do Brasil, existe ainda uma distinção entre polícia civil, militar e federal. A polícia civil, teoricamente, cumpre uma função socialmente útil, já que deveria investigar crimes para que sejam levados à justiça, crimes que também podem atingir trabalhadores (na prática, a polícia civil é inútil, já que a sua taxa de resolução de crimes é baixíssima: menos de 10% dos homicídios são investigados de modo a resultarem na identificação e condenação do autor, não havendo estatísticas nacionais consolidadas sobre os demais tipos de crimes – leia aqui). 

    A polícia federal, por sua vez, investiga crimes cometidos pela burguesia e alta burocracia do Estado (na verdade os acoberta enquanto for preciso ou definitivamente, para que os interesses econômicos e políticos envolvidos possam ser negociados, até que se possa fazer os vazamentos seletivos, etc.). E dentro da polícia militar, existe ainda o corpo de bombeiros, que também desempenha uma função socialmente útil salvando vidas. Todos são de alguma forma parte do aparato repressivo do Estado, com aquela característica comum que citamos acima de se apartar do restante da população de modo permanente, para desempenho de funções parcialmente ou exclusivamente repressivas, para os quais recebem formação (e ideologia) própria. Mas ainda assim, o caso da polícia militar propriamente dita merece uma discussão em separado.

    Primeiro, pelo fato de que o Brasil é o único país do mundo a ter esse tipo de estrutura, uma polícia militarizada, voltada especificamente para repressão. Nos demais países existem tropas de elite das forças armadas ou grupos especiais da polícia civil, voltados para repressão. No Brasil a PM cumpre o papel de força armada voltada para o combate a um “inimigo interno”, a própria população. A doutrina das polícias militares, a formação dada aos soldados, tem como alvo especificamente a grande massa pobre da população (leia aqui) e trata de maneira diferenciada a classe dominante (leia aqui). A PM teria como justificativa de sua existência supostamente uma função social útil de prevenir a prática de crimes por meio da sua presença ostensiva, mas na prática é usada para conter manifestações, quebrar piquetes de greve, agredir e intimidar os pobres (dando “geral” ou “baculejo”), etc. 

    Tudo isso é feito ainda “legalmente”, por mais que às vezes se cometam os chamados “abusos” e “excessos”, tratados como “casos isolados” que supostamente não comprometeriam o conjunto da instituição. Isso na verdade representa uma outra inversão oposta, pois esses fatos “isolados” são a regra e não a exceção (leia aqui). Para além da sua ação “legal”, a PM fornece a base para a constituição de milícias, ou seja, máfias, que controlam ilegalmente os territórios onde atuam, substituindo o Estado (ou expondo a verdadeira face do Estado brasileiro, conforme veremos ao final). O tipo de ação que as PMs desenvolvem cotidianamente, as legais e ilegais, conformam um tipo de ideologia, de psicologia, de caráter e subjetividade social apartado e hostil à classe trabalhadora.

    Ainda assim, o PSTU insiste que os policiais militares fazem parte da nossa classe. Num dos textos mencionados cujos links estão acima, o partido enumera argumentos, em nome do que chama de marxismo, segundo os quais os PMs devem ser considerados parte da classe trabalhadora. Esses argumentos confundem aquilo que os demais trabalhadores fazem acidentalmente ou secundariamente com aquilo que um PM faz essencialmente ou exclusivamente. Um PM não é um servidor público qualquer, como um escriturário do judiciário ou de uma universidade pública, ele não desempenha uma função pública qualquer, mas uma função especial repressiva, por onde o Estado exerce o monopólio do uso da força. Um PM não fica nos bastidores ou no controle administrativo da classe trabalhadora, ele está na linha de frente, atuando fisicamente na repressão. 

    Um PM agride, tortura, mata diariamente e por função, não é como um trabalhador que eventualmente pratica um ato de violência, de machismo, racismo ou LGBTfobia. Um PM tem a função exclusiva de reprimir, não é como um professor que tem uma função secundária de representar a autoridade dentro da escola, ou um bancário, que cobra dívidas das pessoas, entre outras funções que desempenham. Um PM está fora da produção material de riqueza, como um trabalhador dos serviços, do comércio ou dos bancos, mas ele não entra eventualmente nessa produção, como um trabalhador comum que pode trocar de profissão. Em todos os aspectos, o texto do PSTU procura desconhecer que há uma diferença de qualidade abissal entre o que um PM faz como função exclusiva, todos os dias e durante toda uma carreira, apartado da vida social e de armas na mão; e o que um trabalhador pode fazer eventualmente, acidentalmente e secundariamente, num grau infinitamente menor, como parte das engrenagens do capitalismo.

    O ponto crucial da confusão está no momento em que o texto diz que a pergunta a se fazer para esclarecer a natureza de classe da polícia não é “o que ele faz?” mas “como ele se sustenta?” Ou seja, se o policial é assalariado, logo, ele é trabalhador. Por meio desse raciocínio extremamente mecânico e economicista, as características concretas daquilo que um policial faz todos os dias, o modo como pensa, o seu papel na sociedade, etc., são abstraídos no fato de que ele recebe um salário. Estamos no reino do trabalho abstrato, em que o valor se materializa como grandeza quantitativa que nivela todas as atividades humanas. Desaparece dessa análise o trabalho concreto, que produz valores úteis, por meio do qual a vida social efetivamente se reproduz. A subordinação do concreto ao abstrato (valor, salário, dinheiro) expressa a separação entre produção e necessidade humana, e ao mesmo tempo impede a reflexão sobre a necessidade humana. Permanecer no horizonte do trabalho abstrato significa perpetuar a subordinação do trabalho, conforme discutiremos logo adiante.

    Nessa análise extremamente simplista e estática da sociedade de classes, existem apenas a burguesia e o proletariado, e as demais camadas sociais não só não têm um projeto próprio de sociedade (o que é verdade) mas supostamente não têm interesses materiais na sustentação e defesa do capitalismo, o que está redondamente errado. Administradores assalariados e burocratas do Estado (uma camada bem ampla de pequenos chefes, desde diretores de escola, gerentes de banco, chefes de seção, etc., etc., etc.) não pertencem à burguesia, é verdade, porque não são proprietários de meios de produção, mas desempenham a função especial de ajudar a organizar a exploração dos trabalhadores. Essas camadas médias não são parte da burguesia, mas podem ser mesmo assim, na maior parte do tempo, forças sociais ativa e ostensivamente pró capitalistas, e nesse sentido, anti proletárias, anti socialistas. Não importa que o seu vínculo econômico com o sistema seja por meio de salários, importa sim o que fazem concretamente, e não como se sustentam.

    As greves em geral e o problema da subordinação do trabalho 

    Mas talvez o problema mais sério da posição do PSTU não esteja na análise da posição de classe dos policiais, mas no modo como concebem a emancipação da classe através de suas lutas, ou mesmo, que concepção possuem de emancipação humana, se é que possuem alguma. O problema está na concepção dirigista com a qual imaginam poder influenciar as lutas dos trabalhadores, a qual deixa intacta o núcleo da alienação, que é a subordinação do trabalho. Para explicar como isso se verifica, é preciso voltar a uma questão mais profunda, que é o modo como os trabalhadores se emancipam através de suas lutas. Antes de tratar da greve policial, portanto, precisamos tratar da questão mais básica: por que devemos apoiar uma greve (qualquer greve), em primeiro lugar?

    A greve é o momento em que os assalariados disputam com o patrão o preço da venda da mercadoria força de trabalho, ou seja, o salário. Em si mesma, a greve não altera o elemento fundamental da relação capitalista, a subordinação do trabalho. O salário pode ser maior ou menor, conforme a greve consiga ou não uma vitória, mas o assalariamento continua. A ditadura da propriedade privada, o arbítrio do patrão no local de trabalho, o seu poder de demitir ao bel prazer, o poder de dar ordens e ditar o ritmo de trabalho, etc., tudo isso permanece intocado. Uma greve pode conseguir eventualmente um aumento de salário e a concomitante redução temporária do lucro. Mas no momento seguinte o patrão pode recuperar esse lucro, aumentando a produtividade, por meio de inovações técnicas ou intensificando o trabalho, ou seja, aumentando o ritmo de trabalho, as metas e exigências, forçando cada trabalhador a produzir mais dentro do mesmo tempo, modificando a gestão, etc. 

    Na verdade, a greve faz parte da rotina e do funcionamento normal do sistema capitalista. Ela obriga os patrões a aperfeiçoarem os seus métodos de gestão e controle, para recuperar em produtividade o que eventualmente perdem em eventuais aumentos nominais de salários. As greves e lutas dos trabalhadores se convertem num elemento de concorrência entre os capitais que atuam nos diversos ramos produtivos e entre os capitais nacionais. Numa perspectiva histórica, depois de mais de dois séculos de Revolução Industrial, as greves e seus organizadores tradicionais, os sindicatos, ajudaram a aperfeiçoar o sistema capitalista, tornando-o mais civilizado e produtivo. O mesmo pode ser dito das lutas por condições de trabalho e outros direitos sociais, como descanso semanal, férias, licença saúde, aposentadoria, serviços públicos, etc. Todos esses elementos civilizacionais tornaram a gestão do capitalismo mais suave e eficiente.

    Isso significa então que não se deve apoiar nenhuma greve? Afinal, no longo prazo, elas não servem apenas para tornar o capitalismo mais produtivo? Ao contrário, todas as greves e lutas devem ser apoiadas, mas a única condição para que elas possam ter um efeito emancipatório é se produzirem um avanço na consciência e organização dos trabalhadores. E esse avanço não se mede pela conquista de uma pauta econômica e material (o simples aumento de salário), mas pelo desenvolvimento de uma capacidade de organização e resistência no local de trabalho. Uma greve pode conquistar ou não um aumento salarial, mas ela será vitoriosa, na perspectiva histórica dos interesses dos trabalhadores, se conseguir fazer com que esses trabalhadores enfrentem de modo mais firme a ditadura dos patrões nos locais de trabalho. 

A existência dessa resistência é a base para que possa se pensar em lutas mais massivas, que possam se avolumar a ponto de desafiar a propriedade privada e o Estado. Além disso, é só com essa organização de base que é possível pensar em avanço no controle dos trabalhadores sobre o processo de trabalho, que é a base para a auto gestão social. Esses elementos estão todos interconectados e devem ser pensados em conjunto: resistência nos locais de trabalho, ruptura da subordinação do trabalho, ruptura da propriedade privada e controle social da produção. O elo que os conecta é o controle sobre o próprio processo de luta. Aquilo que é chamado de revolução, a derrubada do poder político do Estado, tem que ser entendido como aspecto superestrutural e derivado da revolução social, que só pode se efetivar e se sustentar com o fim da subordinação do trabalho, por meio do controle sobre o processo de trabalho, que começa com o controle sobre a própria luta.

    Para que o embrião de poder dos trabalhadores, latente em toda greve, possa sobreviver para germinar no futuro e acumular forças em direção a uma revolução social, é fundamental, pois, que tenham o controle sobre sua luta. É essencial que se organizem e se expressem autonomamente, ultrapassando as formas que tentam impor limites às lutas. Em especial, a burocracia sindical atua para impedir o desenvolvimento da autonomia dos trabalhadores, encarregando-se das negociações, usurpando as decisões e produzindo acordos que esterilizam a iniciativa própria dos trabalhadores. A burocracia sindical, bem como aquela se forma também em todos os tipos de movimentos e lutas sociais, funciona assim como uma camada auxiliar da classe burguesa na gestão do capitalismo, viabilizando aquele mecanismo pelo qual as lutas econômicas, corporativas e parciais aperfeiçoam o sistema.

    Para que as lutas sociais possam escapar a esse triste destino, as organizações e militantes que nelas intervém com uma perspectiva anticapitalista precisam atuar para que as lutas escapem ao controle das burocracias, para que os trabalhadores ultrapassem os seus ditos “representantes”, para que se enfrentem diretamente e de modo organizado contra o capital, sem as mediações que asseguram o funcionamento “normal” das relações capitalistas e suas instituições. O controle dos trabalhadores sobre suas lutas é o fundamento para o controle sobre a produção e para a auto gestão social, sem os quais não se pode falar em socialismo. Sem controle dos trabalhadores não há ruptura da subordinação do trabalho, e a alienação se reconstitui. Para que o capitalismo possa ser superado, não basta romper com a propriedade privada dos meios de produção ou destruir o poder do Estado, é preciso que o processo de reprodução social seja reconstituído de cima a baixo, sobre controle direto daqueles que o executam, ou seja, dos trabalhadores. É esse horizonte que se deve ter em mente em toda luta, em toda greve.

    Essa tarefa enfrenta complicações imensas quando se considera que o capital modifica constantemente a organização do processo de trabalho, fazendo com que as formas de luta tenham que “correr atrás” dessas modificações (conforme discutido brevemente aqui ). Mas em linhas gerais, insistimos no ponto de que o poder do capital tem que ser quebrado lá onde ele é gerado, no local de trabalho. As lutas políticas superestruturais não fazem nenhum sentido descoladas desse processo de organização molecular, ao mesmo tempo em que as lutas pontuais nos locais de trabalho não fazem sentido descoladas desse objetivo de enfrentar a totalidade do capital.

Viaturas paradas durante greve/motim de policiais militares no Ceará em fevereiro de 2020.

    A insuficiência das concepções dirigistas 

    Colocadas as coisas nessa perspectiva, é evidente que a posição do PSTU se baseia em uma concepção completamente diferente e, a nosso ver, totalmente equivocada. No caso da greve dos PMs do Ceará, o elemento político que se vislumbra é a simples quebra da hierarquia militar. Na verdade, tanto policiais militares quanto soldados das forças armadas estão proibidos de fazer greve e de se associarem sindicalmente. Logo, todo tipo de paralisação desses setores é tratado legalmente como insubordinação ou motim, representando de fato um incidente de perigosa significação para o Estado. Para o PSTU, o simples fato dos policiais se colocarem em movimento é um avanço, já que questiona a autoridade militar. Isso supostamente abriria a porta para mudanças mais profundas, como a desmilitarização, o direito de associação, o fim do regimento militar autoritário, dos trotes, castigos físicos e maus tratos aos soldados PMs em formação (ilegais, mas ainda largamente praticados), etc.

    O problema é que, no caso do Ceará, o movimento se desenvolveu por fora da influência das entidades que defendem esse tipo de pauta, como os Policiais Antifascismo. Ao contrário, as lideranças do movimento expressaram posições favoráveis à ideologia autoritária e policialesca do bolsonarismo (e foram correspondidas pelas autoridades federais enviadas ao estado no contexto da GLO, como mencionamos acima). No caso do Ceará, os PMs estariam sim rompendo com o controle da autoridade superior no seu “local de trabalho” e estariam sim avançando na sua “auto organização” e “autonomia”, mas esses avanços na verdade apontam para o caminho oposto ao da desmilitarização e do controle social sobre a polícia (e menos ainda para o fim da polícia). Inversamente, apontam para o controle da polícia sobre a sociedade, que foi literalmente feita de refém. Por isso o conteúdo político e ideológico do movimento faz muita diferença. 

    O PSTU desconsidera o problema da auto organização e consciência dos trabalhadores em geral, e no caso, também a dos policiais, porque imagina que todo problema de organização consciência é resolvido a priori pela existência do partido, ou seja, deles mesmos. Por isso, consideram viável “disputar a consciência” desses PMs contra as suas lideranças, desconhecendo o abismo que há entre as posições deles e as do partido. Se não tem importância o fato de que os PMs amotinados em Sobral são bolsonaristas e proto milicianos, faz sentido declarar apoio às suas reivindicações, imaginando que desse modo eles vão, assim que tomarem conhecimento do panfleto do PSTU, deixarem de seguir o Bozo e passarem a se ver como trabalhadores.

    Para o PSTU esse abismo pode ser saltado por uma atuação voluntarista e dedicada de seus militantes, que trariam a posição correta para o movimento por meio de palavras de ordem devidamente ajustadas. A necessidade de trabalhos sistemáticos, prolongados, cotidianos, é desconsiderada em nome desse voluntarismo, que na prática resulta em simples retórica. Desconhecemos algum caso em que notas, declarações de apoio ou panfletos lançados de última hora, no calor de uma luta, a partir de uma posição política oposta ao sentido em que ela se desenvolve, tenham invertido o sinal ideológico dessa luta. Como dizíamos acima, trata-se de uma concepção completamente diferente da relação entre lutas sociais e emancipação, por isso precisamos nos estender um pouco mais sobre esse tema.

    Vimos que para o PSTU é indiferente o que as pessoas “fazem”, tudo o que importa é como se “sustentam”, de acordo com as suas próprias palavras. Dessa forma, todo assalariado, mesmo em função de administração ou controle social, como os policiais, também seria parte da classe trabalhadora. A classe, nesse caso, é definida apenas pelo aspecto econômico (salário) ou jurídico (ausência de propriedade), não pela sua função social e material. Não se coloca em questão o problema do controle dos trabalhadores sobre a produção, e presume-se assim que, no lugar dos burgueses proprietários suprimidos pela revolução (tal como o partido a defende), os administradores e controladores responderiam ao partido ou ao Estado. Mas na prática, a estrutura hierárquica de controle sobre o trabalho permaneceria a mesma. Para eles, não se coloca o problema do controle operário da produção, da organização da classe e de sua consciência. Tudo isso é substituído pela atuação do partido. 

    O PSTU radicaliza o viés dirigista presente em toda organização que reivindica a tradição bolchevique. Por meio desse viés, a construção de uma organização que desempenhe o papel de dirigente da revolução é concebido em separado da organização da própria classe. Nessa concepção, o papel da classe é de servir passivamente como massa a ser dirigida pelo partido, não é de organizar a si mesma para assumir o controle da produção. A organização interna da classe, os seus organismos de luta, a sua estruturação desde o local de trabalho, a sua consciência, etc.; não têm a menor importância nesse esquema. O partido resolve tudo, e não tem relevância nenhuma o modo como a classe (ou uma determinada categoria) efetivamente pensa ou se organiza.

    Para o partido, as greves por questões salariais têm valor em si mesmas pelo resultado econômico. O único avanço político que lhes interessa é o do controle do partido sobre os organismos de luta, como os sindicatos. É por meio desse controle que eles imaginam desafiar o Estado, tomar o poder e abolir a propriedade privada. A subordinação do trabalho, tal como discutimos acima, não é relevante para essa estratégia. É somente dentro desse quadro radicalmente dirigista que faz sentido a política de apoiar greves policiais supondo que assim está disputando a sua direção. Essa concepção dirigista, como já dissemos, imagina que se pode cair de para quedas em qualquer luta e assumir sua direção apenas esgrimindo as palavras de ordem corretas.

Por Granamir

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