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10 abr 2020

E o Mandetta? Cadê a esquerda partidária?

Brasília, 18 de Março . (Photo by Andre Coelho/Getty Images)

A pandemia mundial do coronavírus tem afetado todos os países do mundo, alguns deles têm tomado decisões acertadas de respeito às políticas de isolamento social e seguido as recomendações da Organização Mundial de Saúde e começam já a ver o número de mortes e novos infectados diminuir a cada dia.

O Brasil, por sua vez, vai no sentido contrário. Temos como atual ocupante da cadeira de presidente uma pessoa que é totalmente irresponsável, um genocida, que considera que a morte de dezenas de milhares de pessoas mais pobres pode ser justificada para agir em defesa de seus amigos empresários.

Porém, dentro do debate político uma disputa tem surgido entre dois ex deputados do dito “baixo clero” (aqueles deputados e deputadas que ninguém sabe bem como foram eleitos e o que eles fazem ali), mas que hoje ocupam diariamente às manchetes dos maiores jornais do país. A disputa entre Bolsonaro e Mandetta para ver quem será a “estrela” desta crise é cada vez mais evidente.

Bolsonaro tem reagido de uma péssima maneira ao Covid-19. Primeiro, viajou aos Estados Unidos para se encontrar com o presidente Donald Trump, dessa comitiva até então já são 23 o número de pessoas que contraíram o vírus e o ajudaram na disseminação da doença no Brasil. Além disso, Bolsonaro critica o isolamento social e propõe o “isolamento vertical” que em tese seria isolar os idosos e as pessoas em grupo de risco somente, o que na prática significa condenar um número muito maior de pessoas ao contágio colapsando o sistema de saúde.

Além disso, Jair Bolsonaro ataca os governadores e deputados. Faz disputa política em meio ao caos e como sempre, se coloca em sentido contrário aos trabalhadores, afinal, o seu plano político neoliberal é sempre em favor do lucro de curto prazo dos empresários, mesmo que isso signifique muitas mortes.

Entretanto, dentro do Planalto, uma oposição tem sido travada entre Bolsonaro e seu ministro da saúde, Luiz Henrique Mandetta. Uma grande quantidade de pessoas inclusive considera que Mandetta seja hoje uma das poucas pessoas que fazem um trabalho adequado dentro do governo. Mas será?

O que eu entendo dessa situação toda é que o Ministro faz o mínimo necessário, apenas, e que neste momento sua saída seria desastrosa. Agora, pedir “#FICAMANDETTA” como fizeram alguns deputados federais e partidos de “esquerda” é lamentável. Mandetta é um político, oportunista assim como Bolsonaro, que joga de acordo com a opinião pública assim como o seu chefe.

Para comprovar isso, é preciso entender quem de fato é o Ministro da Saúde de Bolsonaro.

Quem é Luiz Henrique Mandetta?

Mandetta nunca foi um deputado muito conhecido, contudo, sempre foi um homem de poucas ações, sempre voltado para o benefício da patronal e com um discurso muito conservador. Foi uma das vozes mais vorazes a favor do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, entoando a todos os cantos o “Tchau, Querida”.

Em termos de posicionamento político, Mandetta também sempre foi contra o programa Mais Médicos que tinha como objetivo suprir a carência de médicos nos municípios do interior, aldeias, regiões isoladas e nas periferias das grandes cidades do Brasil. Com isso perdemos quase 20 mil médicos cuja ausência vai fazer muita falta nesse momento.

Até o início do ano de 2020, Mandetta fazia um forte trabalho na tentativa de convencer a população, presidente, ministros e deputados de que o orçamento para a Saúde já era muito grande. Ou seja, Mandetta tem toda culpa e muito sangue nas mãos por hoje o sistema de saúde não estar suficientemente preparado para uma emergência como a pandemia, fazendo com que muita gente morra sem atendimento.

Além disso, na época da indicação de Mandetta para o cargo, ele estava sendo investigado por fraude em licitação, tráfico de influência e caixa dois.

Mandetta também já foi presidente de Unimed, uma grande corporação privada de saúde e nunca escondeu ser contra o SUS. Sempre planejou restringir o acesso da população mais pobre à saúde pública.

Entretanto, surpreendentemente ele vem desempenhando um trabalho de defesa da vida na frente do Ministério da Saúde, defendendo a quarentena e o isolamento social. Entretanto, devemos ter muito cuidado, ele já provou em mais de uma oportunidade que não está ao lado do povo. Se qualquer pessoa que se opuser o mínimo a Bolsonaro virar herói estamos perdidos.

Isso mostra muito sobre a postura da esquerda institucional neste momento, talvez, se eles quisessem fazer uma oposição séria e consistente, se houvesse um anseio real por uma outra sociedade nós teríamos alternativas para lidar com essa questão, que não passasse por ficar tentando encontrar aliados para a nossa luta dentro do governo.

Nesse momento, é preciso que a esquerda se mobilize para pressionar os governos do Estado a manter a quarentena, lutar para garantir salários e direitos trabalhistas, assim como o fortalecimento das redes de solidariedade locais.

Cobrar uma responsabilização de Bolsonaro e seus aliados por adotarem posturas anti-isolamento. Articular um plano econômico emergencial para lidar com a pandemia, tendo em vista que grande parte da população brasileira não está em quarentena por fatores econômicos, precisam trabalhar e o governo não pode fazer com que fiquem em casa se não garantir ao menos o mínimo para sobreviverem.

Hoje, ao invés de fazerem mandatos propositivos apenas adotam uma postura reativa a Bolsonaro, não constroem alternativas, só tentam responder. Entretanto, Bolsonaro e aqueles que o agenciam já dominam essa postura e agora jogam com a imprensa e com a oposição. Propõem e recuam, demitem e recontratam, dão informações e depois desmentem. Assim, a oposição fica perdida e sempre pautada pelo bolsonarismo.

Ok, efetivamente somos todos contra Bolsonaro. Mas o que vocês, da “oposição” que foram eleitos, estão fazendo para se contrapor ao Bolsonaro? Apenas subir hashtag não salva vidas, apenas se posicionar contra Bolsonaro na internet não serve. É preciso que algo seja feito. Sequer ameaçam uma mobilização real, sequer fingem convocar uma greve geral. Também tem sangue nas mãos quem pode fazer algo e se omite, e é isso que grande parte da esquerda partidária tem feito.

Temos visto uma postura muito “combativa” deles no Twitter, puxando “#FICAMANDETTA” e incentivando panelaços, mas quanto a oposição política real? O que tem sido feito?

Isso serve para nos mostrar quem é que de fato faz mudanças dentro da nossa sociedade, é o povo e somente o povo. Não dá para ter fé nesse sistema burguês, disputar a política institucional pode ser importante mas a mudança somente virá do povo, com ação direta como instrumento de pressão política.

Na contramão dos políticos partidários, os movimentos sociais tem intensificado seu trabalho junto a população mais pobre para lidar com a pandemia. Centenas de lutadores e lutadoras têm se articulado para promover campanhas de arrecadação de dinheiro, alimentos e materiais de limpeza e também articulado redes locais.

Movimentos como a AMPARAR, a Frente Estadual do Desencarceramento de SP e a Rede Contra o Genocídio tem se organizado para denunciar a violência policial e o risco do genocídio anunciado pelo coronavírus nos presídios brasileiros, cobrando medidas para desencarcerar estas pessoas antes que seja tarde demais, algo que a oposição institucional poderia conseguir intervir, salvando muitas vidas, se ousasse pautar o desencarceramento. Movimentos em defesa da população em situação de rua tem se articulado para cobrar medidas de acolhida e tratamento destas pessoas. Mas e o que o deputado ou deputada que você elegeu tem feito? Os vereadores e vereadoras? O Senador do teu estado, o que tem feito?

Frente ao oportunismo e a paralisia da política partidária, se faz necessário reafirmar os valores que norteiam a nossa atuação “autonomia e autogestão”, assim como nesse momento é preciso agir com “Paz entre nós e guerra aos nossos senhores”.

Que nesse momento consigamos nos unir, exercitar nossa solidariedade de classe e fortalecer a denúncia contra a perversidade das classes dominantes. Estamos nos organizando, nos articulando virtualmente, por nós mesmos, para enfrentar essa pandemia e ao mesmo tempo tentar nos fortalecer, pois, ao fim dessa quarentena, será inaceitável voltar a normalidade. O normal já não estava bom, já era excludente, já era desigual, o meu povo preto já morria. Que não aceitemos voltar a normalidade depois de deixarem morrer mais tantos dos nossos.

Foco e que tenhamos muita força para a luta, afinal, só a luta muda a vida!

Por Marcus Nascimento, militante preto, anticapitalista e estudante de serviço social na Unesp.

https://jornalggn.com.br/noticia/mandetta-e-as-circunstancias-como-se-comportou-no-impeachment/
https://outline.com/YSxvvN
https://www.terra.com.br/noticias/brasil/politica/quem-e-mandetta-ministro-da-saude-que-incomoda-o-planalto,b82ad0e313f7d4445e68a9b92e7a2a32xude8ewm.html
https://www.redebrasilatual.com.br/blogs/blog-na-rede/2020/03/nao-faca-parte-do-vergonhometro-do-coronavirus/
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-51983859

0 Comentário

  • Jose disse:

    De pleno acordo. Achava até que o PT, principal partido da esquerda, dono da maior bancada da Câmara, tivesse acabado tamanha o silêncio dos seus integrantes. Seria uma tática, deixar o governo se autoconsumir com duas ações incendiárias e não dar margem à reações à direita? O efeito pode ser o contrário e as pessoas acharem que nem precisamos de oposição já que ela não atua e o desgoverno de auto destrói.

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