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05 abr 2021

Operadores de telemarketing denunciam risco de vida no trabalho durante a pandemia

No início da pandemia houveram inúmeras mobilizações de trabalhadores de call centers por home office. Em resposta a isso, Bolsonaro decretou call center serviços essenciais, quando evidentemente não é, endossando as empresas que querem aglomerar seus trabalhadores cotidianamente. A Teleperformance, grande multinacional do telemarketing, foi denunciada na OCDE já no início da pandemia por gravíssimas irregularidades na França, Filipinas, Colômbia, Reino Unido, Portugal, Grécia, Índia, Albânia, Estados Unidos e México. Entre as violações havia colocar centenas de trabalhadores para dormir em andares lotados de call centers, obrigar funcionários a compartilhar equipamentos como fones de ouvido e retaliação contra trabalhadores que se organizaram para denunciar.

Recentemente, dois dos banqueiros donos do Itáu, Roberto Setúbal e Joao Moreira Salles, assinaram uma carta que critica a política do Governo Bolsonaro para o combate da pandemia, essa carta foi uma tentiva hipócrita do empresariado de se desvincular do genocídio de trabalhadores na pandemia que eles mesmo promovem, pois a verdade é que suas empresas continuam seguindo uma política onde os lucros valem mais que as vidas, não importam quantos dos seus trabalhadores estejam morrendo hoje no processo.

Infelizmente o descaso com a vida se manteve mesmo após um ano de pandemia e na atual situação do Brasil ameaça não apenas a vida dos trabalhadores como de toda a população, colapsando os sistema de saúde pública e privada. Nesse contexto, trabalhadores de call center nos procuraram para denunciar as condições nos seus locais de trabalho. Para manter a anonimidade da entrevista, os nomes foram substituídos.

Vocês podem se apresentar brevemente?

R.: Meu nome é Roberta. Eu trabalho na empresa System Interact com o SAC (Serviço de Atendimento ao Cliente) do Bradesco.

B.: Me chamo Bruno, moro em São Paulo, atualmente trabalho na Teleperformance, para um produto bancário do Itaú.

Como estão as condições de trabalho durante a pandemia?

R.: Em relação às condições de trabalho durante a pandemia, na verdade a empresa não tem nenhuma política para combater a contaminação pelo covid-19. É um trabalho que tem muita aglomeração, ficam cerca de 150 a 200 pessoas no mesmo ambiente por cerca de 6 horas em um lugar fechado, que é o galpão onde tem as PAs. Além disso, o refeitório também não tem janelas e as pessoas têm que tirar máscara para comer – aí é pior ainda porque não tem muita ventilação e tem muita gente sem máscara.

Isso faz com que o lugar seja uma bomba-relógio. Todo dia tem casos de covid-19 no meu local de trabalho, já chegou a morrer gente, infelizmente, gente jovem de mais ou menos uns 30 anos – muito provavelmente pegou dentro da empresa. Todo dia tem gente faltando porque tá com suspeita ou foi confirmado com covid-19 e não tem nenhuma política a não ser falar para as pessoas usarem máscara, que é o mínimo do mínimo, certo?

Além disso, eles não dão mais nenhum outro EPI, uma máscara melhor, nada. E eles não querem colocar em home office também, tentaram jogar os trabalhadores contra o home office falando que tem muita gente que não tem internet boa e que não tem condições de trabalhar em casa, que as pessoas precisam do emprego, como se uma coisa negasse a outra. Então eles não querem colocar home office e agem como se nada tivesse acontecendo no momento que tá tendo 4 mil mortes por dia de coronavírus no Brasil sendo mais ou menos mil só em São Paulo, que é onde eu trabalho. Tanto a empresa como o produto, que é o Bradesco, absolutamente não ligam para a saúde ou para a vida dos trabalhadores. Eles falam que não vão dar home office porque as notas estão baixas, então a pergunta é: as nossas notas valem mais que a nossa vida, é isso?

B.: Eu estou indo trabalhar presencialmente. Dentro da operação existe um distanciamento social mas as salas de operações são fechadas, não tem ventilação de ar, a gente fica 6h no interior de uma sala fechada apenas com ar condicionado, isso é muito perigoso para esse momento que a gente vive, a gente tinha que evitar ao máximo o ar-condicionado. E aí quando chega no horário de almoço, a sala que temos é pequena e as pessoas se aglomeram, na hora de ir embora novamente as pessoas acabam tendo que se aglomerar. Na entrada da empresa, pelos corredores da empresa e para guardar seus objetos no armário também se aglomeram. Pelo tamanho do prédio e a quantidade de trabalhadores que ele mantém, eles não tem um protocolo pra evitar aglomerar.

Nesses feriados antecipados pelo prefeito em torno da páscoa por conta da pandemia, as empresas de call center tem contabilizado apenas o dia 02 de abril como feriado, não realizaram qualquer medida para diminuir o fluxo de pessoas na empresa nesses dias de feriado, nem vão pagar o adicional de feriado ou banco de horas que deveriam nos pagar pela lei. 

Outro grande problema é a falta de equipamentos de segurança, eles só deram uma máscara, então o álcool em gel e qualquer outra coisa fica por nossa conta. Então falta essa questão dos EPIs e um lugar digno pra gente conseguir se alimentar mantendo distanciamento social, com horários alternados, pras pessoas evitarem aglomeração no local de trabalho. Hoje a gente não tem nada de segurança. Também poderiam adotar outras medidas de segurança, para tentar diminuir o risco de contágios e exposição, como testes, óculos e mesmo distribuição de máscaras mais seguras – afinal nem todos os funcionários têm uma máscara adequada todo dia.

Nesse momento tão difícil e a empresa não dá um mínimo para seus funcionários poderem trabalharem com segurança ou até mesmo colocar mais pessoas para trabalhar em casa. O pretexto pra não ter home office são os produtos bancários do Itaú e aí piorou ainda mais a situação depois que o governo federal aplica lá uma portaria que dá respaldo maior para empresa não deixar a gente trabalhar em casa. E aí pela empresa a resposta para gente é essa, que como é um serviço bancário o produto não permite que a gente trabalhe com dados bancários em casa. 

Tem outros problemas no trabalho?

R.: Os principais problemas são esses em relação à pandemia que a gente se expõe todos os dias – também no transporte indo para o trabalho, mas principalmente no trabalho porque é onde a gente passa maior tempo. E aí outro problema é referente ao salário, que é muito baixo. A gente recebe mais ou menos R$ 890,00 por mês, que no jeito que as coisas estão caras hoje não dá para fazer muita coisa. E a saúde mental dos trabalhadores, tanto pelas pressões que tem, que o ambiente do telemarketing é completamente controlado, se a gente passa 1 minuto de pausa eles já reprimem, então eu acho que esse é um outro problema bem relevante no telemarketing.

B.: Para além desse momento da pandemia, a questão salarial é o principal problema, nesse momento que a gente tá vivendo, com toda essa exposição e risco de vida, o valor que a gente recebe é muito baixo né, não chega nem em um salário mínimo, quando chega o líquido em nossas mãos, chega por volta de 940 no máximo, isso aí porque tem vários descontos, essa questão do salário também tá pegando muito assim para as empresas de call center. E a gente sempre escuta relato que alguém tá afastado porque tá com covid-19 ou porque tá com sintomas, então assim tem bastante casos dentro da empresa. Inclusive um desses dias de uma funcionária que a filha dela testou positivo, mas como ela ta sem sintomas, sem sentir nada,  ela continua indo trabalhar, é uma funcionária da limpeza. 

Aconteceram / estão acontecendo mobilizações no setor?

R.: Tá todo mundo muito preocupado com essa questão do home office, porque tem a fase roxa e os call centers continuam trabalhando normal. No nosso trabalho a gente fez um abaixo-assinado sobre a questão do home office colocando exatamente isso, que a nossa vida vale mais e que estamos num momento que a situação tá muito ruim com o colapso do sistema de saúde público e privado. A gente fez um abaixo-assinado de maneira anônima, porque a gente sabe também que a retaliação das empresas é grande e não tem nenhuma estabilidade. O abaixo assinado chegou nas cabeças e eles ficaram com um pouco de medo e no dia seguinte mandaram dedetizar, mas a gente sabe que na verdade era questão do home office, né? O que aconteceu também foi que muitos trabalhadores fizeram denúncias anônimas para vigilância sanitária que ela fez com que ela viesse algumas vezes no nosso galpão.

B.: Alguém divulgou um vídeo mostrando a aglomeração na hora do almoço, chegou até a ser chamada a vigilância sanitária, mas a única medida tomada foi a de abrir mais uma sala, o que não mudou muita coisa pois o espaço continuou insuficiente para poder não aglomerar. Vi notícias do início da pandemia, e mais recente de uma galera de  São Bernardo São Caetano protestando, agora não me lembro de ter alguma movimentação pedindo direito ao home office, mas assim mobilização concreta não.

3 Comentários

  • Osmar Batista disse:

    #Forabolsonaroemouraoaindaem2021

  • Maria Cristina Balan Cestari disse:

    Empregadores: a vida de seus empregados importa.

  • Amanda Dias disse:

    Depois daquele comercial vergonho do Bradesco defendendo a Bia como se preocupace com o assédio …Alias só o da Bia eles se preocupam pq vai nos responde os clientes que ganhamos advertencia e justa causa …pq não usou exemplo do nossos atendimentos com certeza a Bia vai sobreviver agora nos ja não sabemos vergonhoso não sei se sinto do da Bia ou de mim que aguento todos os clientes abusivos sem pode reclama … Triste realidade eles não tão nem aí pra nois muito menos pra nossa saude

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