Somos ex-militantes da Rede, alguns dos quais construíram a rede por mais de quatro anos. Estamos vindo a público para expor os motivos do nosso racha, que se deram em diferentes momentos e por diferentes motivos, mas todos motivados pela ação de uma mesma pessoa. Sabemos que esses motivos, total ou parcialmente, são compartilhados por dezenas de outros militantes de diferentes organizações que construíram a Rede e racharam, sendo estas as principais razões da altíssima rotatividade de militantes da Rede. Nos últimos anos foram se acumulando queixas e práticas reiteradas de desrespeito às decisões coletivas, centralização, manipulação, racismo, violência psicológica e diversos outros problemas com uma articuladora específica.

As principais ações desta pessoa que motivam esta carta podem ser resumidas nos seguintes pontos:
- Colocar a vida de militantes em risco a partir de ações individuais na quebrada, repetidas vezes.
- Passar o nome de militantes e familiares que denunciam a violência policial nas periferias para procuradores e policiais militares.
- Manipular, numerosas vezes, através de conversas informais, diferentes militantes da Rede colocando uns contra os outros, frequentemente usando de informações mentirosas e difamação.
- Situações numerosas de violência psicológica, gaslighting, inclusive acusando mães que sofriam perseguição policial de loucas.
- Frequentes práticas de racismo em suas formas sejam mais sutis ou mais estereotipadas, contra militantes e familiares.
- Desrespeitar, numerosas vezes, decisões de familiares de vítimas do Estado quanto aos rumos de suas próprias mobilizações, assim como atropelar decisões da reuniões de articuladores (que supostamente era a principal instância decisória) e dos GTs que compõem a Rede.
- Causar rachas de numerosos militantes da Rede.
- Inscrever a Rede em editais sem passar por decisão consensual das reuniões de articuladores, definindo de forma arbitrária o destino dos recursos obtidos, utilizando-os para garantir centralização e submissão política interna na organização. A profissionalização da militância sem debate apropriado e a transformação da Rede em mais um ONG de direitos humanos que explora e gere trabalho precarizado na quebrada utilizando de um discurso paternalista de estar “ajudando”.
Em outubro deste ano se iniciou uma série de debates internos da rede procurando responsabilizar essa pessoa por suas ações e afastá-la de suas funções. Tais debates foram implodidos por pessoas subordinadas a esta pessoa, inclusive algumas delas nos ameaçaram de agressão em reunião ao mesmo tempo que outras se utilizaram de um discurso “abolicionista penal e de comunicação não violenta” para defender que esta pessoa não poderia ser responsabilizada por suas práticas racistas e que nos colocam em risco.
A pessoa que aqui tratamos em nenhum momento sequer pediu desculpas ou tomou qualquer medida efetiva para mudar suas práticas, pelo contrário, continua agindo desta mesma forma ainda agora, para além das manipulações internas à Rede. Por exemplo, durante a missa de 3 anos do massacre de Paraisópolis em 1/12/22, uma notória militante e mãe de um filho assassinado por policiais, do Movimento Independente Mães de Maio da Leste, foi tratada com extremo desrespeito, aos gritos, foi afastada, teve a caneta e a folha de papel arrancadas de suas mãos e foi impedida de conversar com as mães de Paraisópolis por essa mesma pessoa que hoje dirige a Rede, a mãe ao sofrer esta ação violenta e constrangedora entrou em choro dentro da Igreja, mais uma situação que essa articuladora tentou abafar. Outro caso, semanas atrás, um texto crítico à Rede foi postado no site do Quilombo Invisível, também sendo alvo de forte comoção desta militante e ameaças desproporcionais que forçaram a remoção do texto pelo autor. Não iremos aceitar novamente essas situações e essas ameaças, sabemos que essas práticas de abusos e covardias só podem continuar se sustentando na informalidade. Não faremos mais nenhuma vista grossa em relação a ação racista, fragmentadora e reacionária desta pessoa, e não hesitaremos em tomar qualquer medida que julgarmos necessária para nossa auto defesa. Qualquer nova ameaça que recebermos será publicizada expondo os nomes dos envolvidos.
Tudo que colocamos nesta carta podemos provar, temos farta documentação, com os anos de histórico das redes sociais da Rede, histórico de grupos internos, conversas privadas e gravações de reuniões. Sabemos que os problemas que colocamos aqui são apenas a ponta do iceberg, mas não temos interesse em abrir a caixa preta e tacar as merdas no ventilador de mais uma ONG de direitos humanos com uma patroa racista e oportunista, que é a situação a que a Rede foi reduzida hoje.
Não queremos perder mais tempo e saúde com essa pessoa e nem com seus subordinados fiéis. Não temos nenhum interesse em disputar os rumos ou as questões internas da Rede hoje. Perdemos qualquer confiança política na maioria das pessoas que ainda estão na rede hoje e queremos apenas distância.
Ironicamente, hoje, grande parte das pessoas que organizaram as mobilizações divulgadas pela Rede já não fazem parte desse espaço, rachar da rede atualmente nos abre muito mais portas do que fecha. Se o objetivo da Rede foi formar uma articulação entre militantes anti racistas de diferentes quebradas e organizações de São Paulo, esse objetivo se concretizou, mas apenas fora da Rede.
Achamos importante enfatizar para desmentir boatos propagados por essa mesma pessoa, que jamais dissemos que as pessoas envolvidas nos editais roubaram a rede ou algo do gênero, apenas questionamos a forma pouco democrática como os editais foram construídos e os efeitos políticos nefastos dos editais para a organização da rede, ao aumentar o poder de centralização desta pessoa sobre a organização. Também sabemos que o principal interesse dessa pessoa na rede hoje não é financeiro, mas político, sabemos que a anos ela tira dinheiro do próprio bolso para pagar determinados militantes que lhe são subordinados. O que é sem sombra de dúvidas o principal motivo desta pessoa não ter sido expulsa ainda da organização e de sustentação dos atropelos sistemáticos que ela pratica em relação às decisões coletivas.
Importante registrarmos aqui apesar de tudo, nossa solidariedades aos funcionários desta pessoa, que sabemos que sofrem as piores formas de assédio trabalhista e nos solidarizamos em relação a exigência de qualquer luta que queiram travar contra ela (como já aconteceu antes, de ela só pagar “salários” atrasados ao ser publicamente questionada).
Não desejamos fazer com que ninguém perca o emprego e admiramos o trabalho de algumas das militantes de quebrada que ainda estão envolvidas nesses editais. Mas não podemos mais seguir cúmplices das práticas criminosas dessa mulher que colocam em risco toda a luta anti racista e as nossas próprias vidas.
Não construímos a Rede para vê la sendo usada como massa de manobra por uma pessoa branca, de classe média alta, que é incoerente com o seu próprio discurso e age reforçando o racismo, pondo acima de tudo interesses pessoais ou políticos, que não passam pela coletividade e atropelam repetidamente as construções feitas a partir da própria quebrada.
Não vamos nomear esta pessoa aqui, pelo mesmo motivo que não vamos assinar esta carta, quem conhece o movimento sabe quem é quem aqui. Não gostaríamos de trazer essa lavação de roupa suja em público, mas entendemos que a situação a muito já passou dos limites e que esse é um assunto que diz respeito ao conjunto dos movimentos anti racistas e anti capitalistas, por envolver pessoas bastante enraizadas nesses movimentos. Com o ascenso de Tarcísio Freitas ao governo de São Paulo nossas vidas estão ainda mais em risco, não é momento de insistir nos mesmos erros de sempre.
São Paulo, 19/12/2022
Por ex-articuladores da Rede de Proteção e Resistente Contra o Genocídio.
5 Comentários
Me solidarizo com a companheirada e lamento que, passado mais de 1 decada, o mesmo motivo que fez com que eu e outros militantes se afastasse da Rede estão ocorrendo ainda.
Compas,
É lastimável que nossa luta, contra toda forma de opressão seja apropriado por pessoas que usam a sua condição socio-econômica e acadêmica, para impor a sua visão colono-capitalista, ainda impondo medo e manipulando os nossos, esse filme é bem conhecido e repetido, infelizmente uma hora isso tem que ter um basta e a pessoa envolvida que provoca tantos males ser exposta com fatos e coragem , mesmo que isso nos custe ainda mais dores!
Toda minha solidariedade as e os compas, que infelizmente tiveram que passar por todo esse caminho de dor!
Nos solidarizamos às e aos companheires de luta da Quilombo Invisível!