Venho aqui relatar um caso de violência policial racista que aconteceu no distrito de Barão Geraldo, a menos de vinte minutos a pé da Universidade de Campinas (Unicamp), na segunda semana de julho de 2023. Nesta data um jovem negro de 23 anos veio encontrar um outro rapaz na república em que moro, o rapaz que ele procurava não estava em casa, por isso ele ficou sentado na frente de casa esperando, ele ficou esperando por 3 horas. Neste período uma viatura da polícia militar com dois policiais que faziam questão de carregar sua armas em punho ao sair do veículo, realizou a abordagem do jovem por três vezes, a polícia disse para o jovem que a abordagem era motivada por ligações de vizinhos que encaravam a presença dele naquela rua como “suspeita”, na primeira abordagem ele levou um tapa, ouvindo que ele devia fazer o que veio pra fazer e ir embora, o jovem informou aos policiais que estava esperando um amigo estudante da Unicamp, o jovem me contou que na segunda abordagem uma das vizinhas do outro lado da rua, estava observando a todo momento e chegou a falar algo com os policiais quando passaram em frente a casa dela, deixando assim a impressão de que teria sido ela a chamar a polícia.
Durante a terceira abordagem, um dos moradores da república ao perceber o enquadro policial saiu para ver o que estava acontecendo. Ao se aproximar disse “bom dia” para os policiais, que o ignoraram, voltaram para viatura e partiram sem falar mais nada. Ele então falou para o jovem entrar e esperar dentro de casa. Conta que momentos depois, chegaram dois policiais de moto (rocam) que ficaram parados na esquina da rua, no quarteirão de baixo. Algo em torno de uma hora depois o jovem ao sair da casa rumo a Unicamp foi novamente abordado pela polícia, que perguntou se era verdade que ele estava indo para a Unicamp, o que o jovem confirmou, então o policial mandou ele entrar no carro e o levou ate a Unicamp, onde ele encontrou o seu amigo, morador da mesma república que eu. A polícia o deixou ir somente quando o avistaram.
Essa situação, apesar de apresentar traços incomuns, não destoa do racismo policial cotidiano no Brasil. O bairro em que moramos em Barão Geraldo tem uma vizinhança majoritariamente branca e de “classe média”, assim como outros bairros semelhantes pelo Brasil, a imensa maioria das pessoas não brancas que se costuma ver andando normalmente por essas ruas são empregadas domésticas, funcionários, vendedores ambulantes ou pedintes. Já havia sido relatado anteriormente a mim por alguns vendedores ambulantes situações de racismo e criminalização que sofreram com a vizinhança. Mas esta é a primeira vez que me deparo com um caso de enquadro tão próximo, no curto período em que moro aqui.
Nessas últimas semanas a violência policial racista resultou nas chacinas de 16 pessoas no Guarujá em São Paulo, o assasinato de Thiago Menezes Flausino de 13 anos na Cidade de Deus além do assassinato de 10 pessoas no complexo da Penha no Rio de Janeiro e de 19 pessoas em diferentes municípios da Bahia, sem que tais fatos tenham gerado uma expressiva mobilização social. As organizações da esquerda dita classista quando muito fizeram apenas tímidas notas de repúdio, em sua maioria ignorando a chacina na Bahia que foi realizada por um governo de esquerda. Me sinto um pouco ridículo de relatar este enquadro banal, muito menos violento do que a maioria dos enquadros que eu tomava nesta idade na quebrada e sobre os quais eu nunca escrevi. Não que esta ação em frente a minha casa não tenha deixado marcas, ativando justificadas preocupações, gatilhos e paranóias.
Minha intenção com este relato é compartilha-lo com outros grupos anti racistas de Campinas, na intenção de trocar informações e experiências em relação a violência policial na região, com a esperança de tentar quebrar minimamente o isolamento profundo em que nos sentimos presos quando acontece uma situação dessa. Um primeiro passo para impedir a continuidade do racismo policial cotidiano é não deixarmos estas violências passarem em branco e nos articularmos pela auto defesa das nossas vidas.
Por um estudante anti-racista.
2 Comentários
Texto necessário.
Meu total apoio a este movimento Antirracista, afinal posso comprovar o quão racista é a população de Barão Geraldo; sou Agente Comunitária de Saúde e trnho diversos relatos de racismos praticado por seus munícipes contea a minha pessoa em pleno exercício da minha profissão.
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